|
25 de setembro 2000
Onde est� o Evangelho da Paz?
Perante uma assembleia internacional de l�deres de diferentes confiss�es crist�s, D. Jos� Policarpo criticou fundamentalismos religiosos das igrejas, recordando que nenhuma est� isenta de pecados
O patriarca de Lisboa manifestou-se contra as "intransig�ncias fundamentalistas de �ndole religiosa que tornam a defesa das "verdades" de cada um em focos de desuni�o". As suas palavras foram dirigidas directamente a dezenas de representantes das igrejas cat�lica, ortodoxa e protestantes, de todos os continentes, que ontem participaram numa liturgia no Mosteiro dos Jer�nimos para assinalar a abertura do encontro mundial inter-religiso que se realiza estes dias em Lisboa.
Disse D. Jos� Policarpo que "os construtores da paz t�m de ter a candura das crian�as e a coragem generosa e sofredora dos m�rtires", caso contr�rio "haver� desordem e toda a esp�cie de ac��es desregradas", citando uma leitura do ap�stolo Tiago lida durante o culto. A todos aqueles l�deres religiosos que vieram a Portugal reflectir sobre o di�logo para a paz no mundo, o bispo lembrou ainda que as suas igrejas, ao longo da hist�ria, n�o est�o "isentas dos pecados contra a justi�a e contra a paz". Por isso, perguntou: "Que fizemos do Evangelho da paz, do mandamento novo do amor, da generosidade gratuita do servi�o?"Palavras que, sem d�vida, constitu�ram uma forte cr�tica e autocr�tica dirigia aos "irm�os separados" de Roma, e � pr�pria Igreja Cat�lica. Por isso o patriarca fez notar que o facto de mostrarem disponiblidade para se reunirem naquele local significa que "todos acreditam que a f� religiosa sincera � um elemento construtor da paz".
Mas n�o foram s� os religiosos o alvo das suas reflex�es. D. Jos� recordou tamb�m as opress�es "do nosso mundo contempor�neo", nas empresas, nos pa�ses totalit�rios, na pobreza e nos desequil�brios na ordem mundial, frisando que "a amea�a de destrui��o violenta n�o se afastou da humanidade, e os conflitos armados continuam a ser o meio para resolver diferendos que se deviam equcionar no di�logo". E afirmou: "S� o direito e a justi�a solidificar�o a paz."
Entre os v�rios religiosos presentes no Mosteiro dos Jer�nimos encontravam-se, sentados em lugar de destaque, o secret�rio-geral da Federa��o Luterana Mundial, Ishmael Noko, e, de frente, o patriarca arm�nio, Arami Keshishian. Coube a este proferir algumas palavras em representa��o dos que est�o fora da comunh�o romana, frisando que a credibilidade das igrejas crist�s est� constantemente a ser questionada pelas sociedades. Para este religioso, a melhor maneira de enfrentar esses questionamentos, para que n�o corram o risco de perder a credibilidade, � apresentar-se humildes, sempre em atitude de servi�o, e em constante fidelidade ao Evangelho. "O nosso poder est� na humildade e no servi�o", afirmou, considerando o encontro nos Jer�nimos "a visiblidade da verdadeira unidade da Igreja".
Junto de D. Jos� Policarpo, em redor do altar, estavam dois cardeais do Vaticano, Edward Cassidy e James Stafford, presidentes do Conselho Pontif�cio para a Unidade dos Crist�os e do Conselho Pontif�cio para os Leigos, respectivamente. Ainda da Igreja Cat�lica, encontravam-se cerca de dez bispos e 40 padres. Os cerca de 30 representantes de outras confiss�es crist�s, ortodoxos e protestantes, estavam sentados um pouco adiante do altar, destacando-se, num patamar mais alto, o patriarca arm�nio e o presidente da Federa��o Luterana, representando, respectivamente, os que se situam dentro da sucess�o apost�lico, e os que surgiram a partir da Reforma.
O rito usado na celebra��o foi o romano. Isto significa que s� os cat�licos participaram na comunh�o (tomar a h�stia). Os outros assitiram. Uma situa��o que nos fez lembrar o amigo que nos bate nas costas mas nunca nos convida para comer do seu p�o. "S�o passos que ainda precisam de ser dados dentro do di�logo ecum�nico", comentou ao DN D. Jorge Ortiga, arcebispo de Braga.
Seja como for, o abra�o da paz foi dado, e caloroso. No final da missa bateram-se palmas ao ritmo dos c�nticos. Os ortodoxos, habituados a uma solenidade imaculada das suas celebra��es, mostraram-se surpresos e sorriram. C� fora, depois, lan�aram-se seis pombas, com desejos de paz e unidade. Lisboa acabava de assistir um acontecimento hist�rico, raro, inspirador, com certeza, de novos tempos. Afinal, tudo depende dos homens.
Pol�ticos e jovens encheram os Jer�nimos
M�rio Soares e Maria Barroso, ao lado do presidente de Cabo Verde, Mascarenhas Monteiro, e do pr�ncipe Aga Khan, eram algumas das personalidades presentes na celebra��o eucar�stica realizada no Mosteiro dos Jer�nimos. Para al�m do ecumenismo ali vivido, pode dizer-se que tamb�m se assistiu a um culto religioso aberto a personalidades n�o crentes a quem a Comunidade de Santo Eg�dio n�o enviou directamente conv�te por se tratar de um acto religioso. No entanto, foram os jovens que mais de destacaram, sendo a maioria deles italianos.
Deslocaram-se a Lisboa cerca de mil e, conforme o DN p�de verificar, � gente j� habituada a participar em eventos deste g�nero. A sua estada em Portugal vai ser tamb�m aproveitada para incentivar o crescimento da delega��o de Santo Eg�dio no nosso pa�s, que conta apenas com cerca de 50 jovens.Licinio Lima