Comunità di S.Egidio


 

27/02/2003


Os M�rtires Crist�os N�o Aspiram ao Suic�dio
Entrevista com Andrea Riccardi

 

Historiador e presidente da Comunidade de Santo Eg�dio, Andrea Riccardi fez um levantamento do que foram as persegui��es e mart�rios dos crist�os durante o s�culo XX. O resultado � um fresco impressionante: Riccardi diz que pode calcular-se em tr�s milh�es o n�mero de pessoas mortas s� por terem f�.

Andrea Riccardi esteve na quinta-feira passada em Lisboa, a apresentar o seu livro "O S�culo do Mart�rio" (ed. Quetzal). Ao P�BLICO, falou do que mais o impressionou neste trabalho, al�m de se ter referido � pol�mica sobre os arquivos relacionados com Pio XII (ver edi��o de domingo passado).

P�BLICO - Qual foi a sua experi�ncia ao ver estes testemunhos de m�rtires?

ANDREA RICCARDI - N�o quero ser falsamente humilde: creio conhecer a hist�ria do cristianismo do s�culo XX, escrevi livros, trabalhei sobre alguns problemas. Mas ver esta hist�ria de m�rtires tocou-me muito. S�o os subterr�neos, as catacumbas da hist�ria de um cristianismo martirizado.

P. - E que n�o era conhecido...

R. - Pouco. Era conhecida a grande persegui��o russa, a dos arm�nios feita pelos turcos, mas n�o era tomada como uma vis�o de conjunto. Era um mosaico: hist�rias diversas, factos e quest�es diversas. Agora, chegou-se a um fresco incr�vel do mart�rio do s�culo XX. Por um s� motivo? H� um que os une a todos: s�o crist�os. Mas depois h� raz�es muito diferentes.

P. - Como olha agora para a hist�ria e para a f�, tendo em conta estes testemunhos?

R. - O mart�rio crist�o n�o pede vingan�a, os m�rtires morrem perdoando. � um mart�rio n�o-violento, n�o � um mart�rio de �dio. Isto � de grande import�ncia. Tamb�m a Igreja deve entender a mensagem dos m�rtires, que n�o foi ainda compreendida. � a mensagem e o testemunho de uma for�a d�bil. O cristianismo � uma for�a d�bil. H� muito a descobrir, de novo, no cristianismo. Cito a frase do padre Men, de origem hebraica, russo, ortodoxo, morto em 1990, talvez uma das �ltimas v�timas do KGB. Ele diz que o cristianismo � qualquer coisa mais que uma forma cristalizada, � um tesouro a descobrir.

P. - Estes testemunhos podem levar ao risco de acentuar a dimens�o sacrificial da f� crist� em detrimento da reden��o ou da ressurrei��o?

R. - Os novos m�rtires n�o trazem consigo um clima sacrificial barroco do cristianismo. Os novos m�rtires n�o queriam morrer. Examinei centenas, milhares de hist�rias. � gente que n�o queria morrer. As freiras que ficaram em �frica ao lado dos doentes do �bola n�o queriam morrer, mas sentiam que n�o podiam deixar essa gente que lhes estava confiada.

Isto explica-se com um vers�culo da Escritura: "O amor � forte como a morte." Estes m�rtires n�o aspiram ao suic�dio. Procuram, at� ao fim, modos de n�o morrer. Falo-lhe de uma pessoa que conheci: o padre Christian de Cherg�, monge trapista na Arg�lia, prior do mosteiro de Tiberine. Conheci-o pessoalmente. Foi raptado pelos terroristas fundamentalistas do GIA [Grupo Isl�mico Armado]. Da documenta��o que temos, vemos que o padre Christian - que depois foi morto, com os seus sete irm�os, pelos terroristas - lutou, discutindo com eles, para sobreviver. O m�rtir crist�o n�o � um suicida, n�o � um her�i que despreze o perigo. � algu�m que busca viver at� ao fim a pr�pria dimens�o. Mesmo com risco da vida, mas nunca procurando a morte.

P. - Que casos o impressionaram mais?

R. - N�o saberia dizer-lhe. S�o tantos os que me impressionaram: os m�rtires das religi�es - do isl�o, do pr�prio budismo tibetano. Impressionou-me muito a R�ssia, esse mart�rio de um povo crist�o que foi morto pela f�. H� hoje uma documenta��o impressionante publicada pelos colegas russos em que o KGB e as organiza��es securit�rias escreviam tudo. Era uma mentalidade burocr�tica. Escrevendo tudo, chegamos a relat�rios perfeitos, uma documenta��o sobre o mart�rio feita pelos pr�prios assassinos, onde se descobre uma rela��o muito particular [entre o] m�rtir e o assassino.

Ant�nio Marujo